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Se há uma coisa que será notada no próximo ano, será o sistema bancário.
Desde logo porque todos os bancos nacionais já sabem que rácio de capital (common equity tier I - phasing in) terão de ter por recomendações do BCE, que agora estipula um rácio para cada banco em função dos riscos da sua carteira de crédito.
Não é verdade que estes bancos esperam testes de stress este ano. O único que terá testes de stress agora será o Novo Banco, porque devido a circunstâncias especiais não o fez antes. Mas o Novo Banco é o grande problema do sector bancário e pode contagiar o sistema. Desde logo porque as exigências de capital que serão exigidas pelo BCE são previsivelmente muito elevadas (pode chegar aos 2 mil milhões) e não há como resolver esse problema porque o banco não foi vendido a tempo e há até ao Verão para o fazer (o adiamento é possível). O banco já tem um capital de 4,9 mil milhões e o seu valor está bastante abaixo desse montante, pelo que mais capital, ou menos activos não valorizará o banco. A contratação de Sérgio Monteiro, uma espécie de Macgyver das vendas difíceis, revela bem a urgência do Banco de Portugal de vender o Novo Banco até ao Verão.
O Novo Banco está num encruzilhada dificil. Porque o Banco de Portugal impede aumentos de capital que teriam de ser injectados pelo Fundo de Resolução, e a administração do Novo Banco diz que os activos que têm para vender não chegam para reforçar o capital. Na prática, seja que solução arranjem o Novo Banco arrisca-se a ser uma perda substancial para o sector bancário, porque são estes os donos do Fundo de Resolução.
Também a CGD tem exigências de capital do BCE difíceis de cumprir. O banco do Estado ainda tem de pagar 900 milhões de CoCo´s ao Estado, ainda nada pagou e Bruxelas exige que pague, e o banco terá de vender activos para conseguir ter dinheiro.
A Caixa, para além de ir sofrer o turbilhão das mudanças de gestão (com um novo Governo no horizonte), vai ter de pagar a ajuda do Estado e está impedida por Bruxelas de fazer um aumento de capital para isso. A venda de alguns activos (resta saber quais) estarão forçosamente na agenda de 2016. Mas chegarão?
O próximo ano haverá vendas que cheguem de partes de bancos. Mas há aqui um problema que ninguém está a contar. A que preços se vendem esses activos? É que se for abaixo do valor do balanço têm de registar a imparidade e lá se vai o capital.
Esse é o problema do Novo Banco, mas é também o problema do Banif e explica o adiamento sucessivo da venda da Açoreana.
O Banif é o caso mais bicudo da banca. Pois tem de pagar os 125 milhões de CoCo´s (empréstimo) ao Estado, pois Bruxelas exige, e não tem capital para isso. Tem de vender activos. Vai vender o banco em Malta e a Açoreana (metade desta é da Rentipar). Mas a venda da seguradora vai provocar uma imparidade significativa no Banif e desta feita, se o capital entra por um lado, acaba por sair por outro.
O Banco terá de arranjar investidores privados para se substituir ao Estado que para além do empréstimo tem lá acções especiais no valor de 700 milhões de euros, mas quem é que vai entrar no Banif? Quem a prazo consegue investir na banca portuguesa se ainda por cima se aproxima um vendaval político que pode fazer disparar os juros da dívida soberana e comprometer as metas europeias do défice?
O Banif pode ser vendido com perdas para o Estado, se for vendido ao actual baixissimo preço de mercado.
Por outro lado já se sabe que o BCE exige ao Banif um reforço de capital de 150 milhões. O Banif tem actualmente um rácio de 8,5%, e vai ter de cumprir os novos rácios de solvabilidade, exigidos pelo Banco Central Europeu.
Continua no ar a pergunta: onde vai o Banif encontrar soluções para manter o capital num nível legal?
Para além disso há o BCP que terá de levar com o impacto na Polónia da imputação dos custos de conversão de empréstimos de francos suíços para zlotys e terá de ter dinheiro suficiente para devolver os 750 milhões de Coco´s ao Estado. O banco tem até 2017 para o fazer, mas sempre disseram que o queriam fazer em 2016. A isto acresce o rácio de capital BCE que ninguém sabe qual é para o banco liderado por Nuno Amado. Terá o banco português de fazer um novo aumento de capital? Tem capital suficiente?
O BCP tem ainda alguns activos que poderá vender. Vai vender o Activo Banco em 2016? E a Polónia vai continuar a ser importante para o BCP? O Governo polaco vai aprovar um imposto que para a banca, e de acordo com cenário base nesta altura, é de 0,39% sobre o total dos activos financeiros, o que irá afectar os lucros da unidade polaca. Continuará a fazer sentido olhar para a Polónia como um mercado core para o BCP?
Em Angola o BCP já resolveu o assunto com a fusão do Millennium Angola com o Atlántico (banco da Sonangol, liderado por Carlos Silva). O banco liderado por Nuno Amado vai ficar com 20% da nova instituição. O banco reduz assim a sua exposição ao mercado angolano, pelo que a operação permite "um impacto positivo estimado de 37 pontos base no rácio de capital ‘common equity tier one’", de acordo com as regras em vigor. Nesse aspecto está mais avançado que o seu rival BPI.
O BPI é o único que já disse que o rácio BCE não é superior aos 10,6% que já tem de common equity tier 1 (que alívio!), mas o banco tem outro problema: o spin off dos activos angolanos. O BPI pretende dividir-se em dois, um doméstico e outro África e assim ultrapassar o problema da exposição aos grandes riscos a Angola, por sua vez também criado pelo BCE quando excluiu este país de equiparado em supervisão à Europa.
O BPI passará a ser um banco doméstico, com menos lucros e também menos capital. Conseguirá ser um banco doméstico rentável?
O spin off é o tema futuro do banco liderado por Fernando Ulrich, uma vez que é exigido o acordo com o accionista angolano Unitel (Isabel dos Santos). Esse é um teste ao acordo entre os dois accionistas: Caixabank e Isabel dos Santos, que se têm posto em confronto nas estratégias para o BPI.
Falta ainda saber se o Montepio terá alguma vicissitude que o obrigue a aumentar o capital. O banco tem já a vantagem dada pelo novo regime das caixas económicas, publicado a 10 de Setembro, que abre portas a novas fontes alternativas de capital. Até aqui, a Caixa Económica Montepio Geral só poderia receber injecções de capital da Associação Mutualista, sua proprietária; agora, esta poderá vender até 49% da sua posição, ou seja, pode reduzir a sua posição desde que se mantenha maioritária.
Mas a grande revolução na banca vem das novas regras de bail-in que entrarão em vigor em Janeiro de 2016.
Essas novas regras europeias chamam os obrigacionistas não subordinados e os depositantes com depósitos acima dos 100 mil euros ao resgate dos bancos. Como? Convertendo esses valores em acções do banco.
Há uma hierarquia de credores a ser chamados ao resgate, e poderá esse contributo ser balizado. Segundo as minhas fontes a Resolução de qualquer banco obriga ao bail-in (que contrasta com o bail-out de ajuda vinda de entidades externas ao banco, como a troika) dos credores em pelo menos 8% da soma do passivo e capitais próprios.
Ora havendo dificuldades declaradas em arranjar capital em bancos como o Banif e Novo Banco não é nada de estranhar que possamos voltar a passar pela experiência da Resolução. Mas há imediamente um pensamento que nos assalta. Esse bail-in terá imediatamente um efeito de contágio, e pode provocar uma corrida aos depósitos.
Poderá a troika acabar por voltar para ajudar os bancos? Não me parece um cenário irreal.