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A conferência de imprensa do Novo Banco para apresentação dos resultados anuais de 2015 teve um sabor a fim de ciclo. Eduardo Stock de Cunha vai sair do Novo Banco. A decisão não é de agora. Desde que o ano de 2015 fechou que o banqueiro, que tentou recuperar o Novo Banco o máximo que pode, decidiu sair e voltar para Londres para a sua família. "Sou o porta-voz do Novo Banco, mas não sou o Novo Banco. Sempre o disse que estou aqui transitoriamente. Sou um empregado do Lloyds Bank. Estou aqui em comissão de serviço, em leave of absence. A minha comissão de serviço acabará dentro de algumas semanas. Tive o cuidado de perguntar no Lloyds, ao seu CEO, António Horta Osório, caso haja interesse das autoridades portuguesas, se o Lloyds me permitia ficar aqui até ao Verão, e tentar conciliar alguma novidade no Novo Banco que possa existir para os próximos meses (apesar de o banco poder sobreviver assim até 2017), e a resposta que obtive é que poderia ficar aqui mais alguns meses, e falámos no Verão. Mas para eu aqui estar é preciso ainda que o accionista queira. O Banco de Portugal tem total autoridade para decidir". Disse o banqueiro.
Nesta resposta intui-se também que a venda, que deverá ser acompanhada pelo ainda presidente em leave of absence, poderá ter o Santander como protagonista. Eduardo Stock da Cunha é um ex-Santander, como sabem. Penso que nalgum momento desta história se pôs a hipótese de o comprador potencial poder ficar com Eduardo Stock da Cunha como presidente para o futuro do banco. Essa hipótese hoje é uma miragem. Os tempos mudam hoje rápido demais e se em 2015 havia a possibilidade de, por exemplo, o Novo Banco ser integrado no BPI, o que poderia levar Eduardo Stock da Cunha a deixar de estar cá em leave of absence e passar a ser um presidente definitivo, hoje já não há essa possibilidade. O mundo da alta finança mudou muito desde então. É o próprio Eduardo Stock da Cunha quem diz "não deve haver nenhum banco europeu que valha hoje o que valia em 2014". Por outro lado, Portugal é um país onde a banca promete ter alguns problemas nos próximos tempos. As fusões são inevitáveis.
Mas haverá outro facto a pesar na decisão de levar Eduardo Stock da Cunha a cumprir o prazo do seu leave of absence, ainda que com algum adiamento relativo: As surpresas que encontrou nos créditos do Novo Banco e que levaram o banco aos seus prejuízos de quase mil milhões de euros. Caramba! Imaginar que este banco era o Banco Bom do BES. O que seria se fosse Banco Mau?
Eduardo Stock da Cunha levou com o peso de créditos tão maus que pesaram, só por si, 764 milhões de euros nos resultados do Novo Banco. Ou seja, o mau crédito representou 78% dos prejuízos de 980 milhões registados em 2015. E esta carteira de crédito, ainda vai pesar nas contas deste ano. Ao certo só lá para 2018, estima o board, é que o banco bom do BES voltará a ter lucros.
O elevado valor das provisões que atingiu 1057,9 milhões de euro, e foi influenciado por perdas em activos transferidos do BES. O reforço de provisões para imóveis e para as 50 maiores exposições ao risco, que já existiam à data da resolução do BES, totalizou 592,3 milhões, explicou o banco.
O prejuízo foi de 980,6 milhões depois da anulação da totalidade dos prejuízos fiscais reportáveis relativos ao ano de 2013 no valor de 160 M€.
Não fossem os créditos herdados do antigo BES, o banco teria tido um lucro de 125 milhões de euros. O banco liderado pela equipe de Eduardo Stock da Cunha tem para se gabar o facto de o produto bancário de 879,6 M€, ter o maior peso (51%) do resultado financeiro (margem).
Disse então Eduardo Stock da Cunha: "Relativamente às imparidades dos trimestres e às 50 maiores exposições de risco [créditos], isto são situações que vêm do passado, a maior parte são créditos que não estão de acordo com o business model do Novo Banco. Relembro que o primeiro critério do BCE para avaliação de bancos para este ano é o business models. São situações que à data de 3 de Agosto de 2014 já existiam, mas não se conheciam em toda a sua extensão, porque se tivessem sido conhecidas em toda a sua extensão teriam sido relevados naquela data".
De facto, o crédito em risco representava 22,8% do total da carteira de crédito e a cobertura era de 68,2% e a carteira de activos não correntes detidos para venda tem provisões afectas correspondentes a 27,3% do seu valor bruto.
A maior parte dos custos relacionados com a herança do BES resultou da necessidade de registar crédito em incumprimento e a desvalorização de imóveis. No total as provisões para as 50 maiores exposições de risco e para a carteira de activos imobiliários ascenderam aos tais 592 milhões.
O mau legado do BES gerou 78% dos prejuízos do Novo Banco.E para além das imparidades, a anulação de juros contabilizados indevidamente retirou mais 172 milhões. Ao todo foi esse crédito (imobiliário, a accionistas entre outros) que gerou os 764 milhões de euros de perdas para o Novo Banco no ano passado. Era uma coisa espantosa a carteira de crédito do BES!
Se a esta realidade somarmos a recente benesse (no capital) da retirada de quase 2.000 milhões de euros de dívida sénior enviada para o chamado BES "mau", podemos ver em que estado ficou o banco bom aquando da Resolução de Agosto de 2014.
Uma opção de retirar obrigações séniores do BES para capitalizar o Novo Banco que foi muito criticada pelos instituionais internacionais, e que esteve a ponto de ser considerada um evento de crédito que poderia ter feito accionar os Crédit Default Swaps que cobrem o risco dessas obrigações.
Eduardo Stock da Cunha diz que acharia simpático que os credores tivessem antes recebido ações do Novo Banco. Esta sentença é importante e revela o desprendimento do banqueiro em relação a essa decisão dos reguladores bancários.
Uma despedida com chave de ouro.
A conferência de imprensa serviu também para esclarecer outra das manchas do mandato: a venda do Novo Banco Cabo Verde a José Veiga (que era dono da maior parte do dinheiro lá depositado). "Não me compete a mim avaliar a idoneidade de um comprador de um banco que não [está] em Portugal". Foi assim que Eduardo Stock da Cunha justificou o acordo de venda do Banco Internacional do Cabo Verde, através de concurso, a uma sociedade liderada por José Veiga, agora em investigação pela justiça portuguesa.