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Ontem, num domingo à noite, começaram a chegar as notícias da venda do Banif ao Santander por 150 milhões de euros. Era na verdade a segunda parte de uma notícia muito mais importante: tinha sido aplicada ao Banif a tão prevista medida de Resolução de que só conhecêramos no caso doloroso do BES. Mas agora numa outra nova versão. Em 8 anos vimos as medidas de intervenção dos bancos passar pelas mais variadas mutações. Sou quase tentada a dizer que a Europa aplica uma medida de resolução nova a cada intervenção necessária.
Um dos jogos de sombras foi a venda do Banif apregoada nas últimas semanas, com os jornalistas a anunciar interessados e candidatos. Diria que quem lesse pensaria que estaríamos perante um banco muitíssimo concorrido. Cheguei a duvidar das minhas capacidades para analisar bancos. A mim parecia-me absolutamente difícil que alguém comprasse o Banif tal como ele era, o que mais se me apresentava provável era uma medida de Resolução. Havia em mim a incógnita de como iria o sistema bancário digerir mais uma resolução sem pôr em causa o seu capital.
Claro que afinal o Banif era invendável e a venda voluntária do Banif foi inviabilizada. Na verdade o Santander Totta, tal como sempre me tinha sido explicado, só queria activos, nomeadamente os balcões. O Santander comprou um "banco" bom, que não se chama nada e que vai ser integrado no Totta, que fica assim com um conjunto de activos e passivos (depósitos de apenas seis mil milhões) do banco. Ao todo adquirem cerca de 11,1 mil milhões de euros de activos e passivos, incluindo depósitos, do Banif, desembolsando para isso 150 milhões de euros (um preço de urgência).
Sabe-se entretanto (pela deliberação do Banco de Portugal) que o banco foi antes declarado em risco ou em situação de insolvência (no sábado), quando seguiu o convite para o Santander e o Popular apresentarem ofertas vinculativas.
A solução aplicada, mais uma vez descrita pela Comissão Europeia que a protagonizou, passou ainda pela transferência de activos depreciados, com um valor contabilístico líquido de cerca de 2,2 mil milhões de euros para um veículo de gestão de activos, detido na totalidade pelo Fundo de Resolução de Portugal que o pretende vender mais tarde (veículo esse com capital de 422 milhões).
O Banif deixa de existir como banco independente. Como tal, o BCE acabou por não avançar com a retirada do estatuto de contraparte, na medida em que o Banif deixou de existir com a medida de resolução anunciada. Isto é, o que afinal a TVI tinha dito, apesar de ser meia verdade e de ter sido dita de forma pouco rigorosa, e que terá provocado o aceleramento da fuga dos depósitos (números divulgados falam de 900 milhões o que é só por si um motivo de intervenção por falta de liquidez num banco com a dimensão do Banif), não era totalmente falso. Ao contrário do que foi dito na noite da notícia-torpedo. Mais um jogo de sombras o desmentido ao desaparecimento do Banif.
"Os accionistas do Banif e os detentores de dívida subordinada contribuíram plenamente para o custo da resolução, reduzindo assim a necessidade de auxílios estatais, em consonância com os princípios de repartição de encargos". Se toda a gente se espantou com o buraco do BES que deu origem à Resolução, olhem para o Banif e percebam que um banco é um poço sem fundo quando se trata de perdas. Os bancos são por natureza multiplicadores de dinheiro, nas perdas não perdem esse efeito multiplicador.
Foi quando na quarta-feira o Banco Central Europeu disse que ia retirar o estatuto de contraparte ao Banif que o destino do banco foi finalmente traçado e acabou por ditar a venda do Banif nas condições anunciadas no domingo. O problema de financiamento alegadamente provocado pela notícia da TVI é que levou à perda do estatuto de contraparte, o banco deixa de ter acesso a financiamento europeu, situação que já tinha ocorrido em Julho de 2014 ao BES e que acelerou a queda deste banco. Com isto não pude deixar de me lembrar das declarações de Jorge Tomé na sua entrevista à SIC: “Não há qualquer tipo de comparação entre o Banif e o BES”. Mais um jogo de sombras.
A Comissão Europeia acabou por aprovar os planos de Portugal para conceder assim cerca de 2,25 mil milhões de euros de auxílio estatal para cobrir o défice de financiamento na resolução do Banco Internacional do Funchal.
Uma outra medida de auxílio no valor de 422 milhões de euros cobre a transferência de activos depreciados para um veículo de gestão de activos.
Por último, a Comissão aprovou uma margem adicional de segurança sob a forma de uma garantia do Estado para prever eventuais alterações recentes no valor da parte vendida ao Banco Santander Totta, o que eleva o total das potenciais medidas de auxílio para quase 3 mil milhões de euros. Isto porque a medida de resolução prevê que o Santander possa voltar a contactar o Estado no sentido de renegociar a avaliação feita aos activos que comprou agora.
Estes valores vêm acrescentar‑se aos cerca de 1,1 mil milhões de euros de auxílio aprovados pela Comissão em Janeiro de 2013, a título temporário, e finalmente aprovados ontem. Destes o Banif pagou 275 milhões no que se refere a CoCo´s.
Se a esta factura acrescentarmos a participação dos accionistas e obrigacionistas subordinados que perdem direito aos seus títulos e por essa via ajudam à Resolução, então os montantes são incompreensíveis para um banco da sua dimensão. Banif, o banco pequeno em tamanho, mas grande nas perdas.
Foi muito caro intervencionar o Banif e a única maneira de um banco intervencionado não perder mais dinheiro é ver integrar o banco bom numa boa instituição financeira de forma imediata, a resolução ao BES e criação do banco de transição é disso prova. Se o "novo Banif" não fosse imediatamente vendido ao Santander Totta podem ter a certeza que estes milhões, como o passar do tempo, não iriam resolver grande coisa. O Novo Banco, veja-se, o banco com os activos bons do BES, recebeu de capital 4,9 mil milhões, mas nem por isso se vende num ápice. O prazo voltou a ser adiado para um horizonte agora sem prazo. A saga da reestruturação volta ao Novo Banco, mais uma vez vai reestruturar para reforçar o capital e vender.
O auxílio do Estado ao Banif apoiará igualmente a liquidação ordenada dos restantes activos depreciados do Banif. Todos os depositantes continuam a estar plenamente protegidos. O outro jogo de sombras são as declarações de António Costa a garantir que todos os depositantes estavam protegidos quando já sabia que a resolução ao Banif iria ser aplicada antes da mudança da lei europeia que chama depósitos acima de 100 mil euros e obrigações seniores ao resgate. Diz isso como forma de atenuar o anúncio de que não conseguiria proteger da mesma maneira os contribuintes. Assim como quem tentou imenso salvar os contribuintes, mas só conseguiu salvar os depositantes. Um teatro autêntico.
O modelo banco bom, banco mau teve no Banif uma nuance é que a aplicação da medida de resolução levou à separação do Banif não em duas, mas em três partes: a operação bancária, com créditos e depósitos, que passou para o Santander Totta e que este pagou 150 milhões; os activos imobiliários e algumas participações e créditos de má qualidade serão transferidos para uma sociedade veículo, a Naviget; outras participações sociais, obrigações para com accionistas relevantes, obrigações de dívida subordinada, entre outros, ficam no Banif, um banco em resolução que ficará na esfera do Estado.
A companhia de seguros Açoreana onde o banco tem 47%, vai passar a ser propriedade do veículo que foi criado para ficar com os activos do Banif que o Santander Totta não quis comprar. Com a empresa vão os seus cerca de 700 trabalhadores.
No veículo que vai passar para o Estado, fica ainda o banco de investimento do Banif. o Tesouro injectou 422 milhões de euros. O retorno que possa advir destas alienações vai permitir "a minimização deste custo" da ajuda estatal. Ao todo, o Tesouro colocou 2.255 milhões de euros neste veículo e no banco mau.
A este valor junta-se ainda mais uma garantia estatal de quase 750 milhões de euros.
A fatia mais importante deste montante corresponde aos 1.766 milhões de euros que serão financiados directamente pelo Estado e usados para recapitalizar o que sobra do Banif. Cerca de mil milhões são destinados a injecções de capital necessárias para corrigir os desequilíbrios contabilísticos que resultam do destaque dos activos que o Santander não quis comprar e que ficam na esfera pública. Como estes activos, sobretudo crédito imobiliário, têm imparidades associadas (perdas), foi preciso transferir também capital para cobrir essas imparidades, designadamente para o veículo que fica a gerir os activos de pior qualidade do Banif.
O ministro das Finanças manifestou a esperança de que a gestão dos activos maus, sobretudo via venda, permita retornos que baixem o custo financeiro da resolução do Banif. Quanto maior for o nível de perdas agora reconhecido, maior será o potencial ganho no futuro e a Comissão Europeia impôs um haircut de 75% nos activos que passam para a sociedade veículo, o que ajuda ao potencial de ganho futuro com a venda. But we never know.
A resolução do banco, que implica custos elevados para os contribuintes foi o culminar de um processo que se arrastava há quase três anos e que sempre teve do outro lado, em Bruxelas, uma Comissão Europeia irredutível na opinião de que o Banif não tinha viabilidade e deveria ser integrado num banco maior. Foi o que em parte acabou agora por acontecer.
De quem é a culpa do Banif ter chegado até aqui? Ninguém se devia poder esquecer que no fim de 2012 o Banif foi intervencionado ao abrigo da lei da altura, e já aí o Estado teve de pôr 1.100 milhões de euros no banco que fora de Horácio Roque. O que se compararmos com o BPI que antes tinha precisado de 1.350 milhões, permite perceber a dimensão do problema do Banif em comparação com a sua reduzida dimensão de activos. Todos parecem esquecer que o Banif foi intervencionado em 2012 por causa da situação financeira criada pela gestão de Roque. Por muito que se gostasse de Horácio Roque a sua equipe de gestão não pode ser desresponsabilizada disto. O Banif foi ainda o único que o Estado para o intervencionar teve de se tornar accionista com 700 milhões de euros (e não apenas em CoCo´s). Essa ajuda do Estado andou em bolandas durante dois anos entre a Direcção de Concorrência Europeia e cá. Sucederam-se oito planos de reestruturação chumbados. E só agora foi aprovada essa ajuda pela DGComp concedida na altura como temporária.
A troika sempre foi céptica quanto à recapitalização do Banif e a Concorrência europeia sempre duvidou dos planos de reestruturação, apesar de ter aprovado a ajuda pública de forma temporária, ainda no tempo de Vítor Gaspar, na altura com o caso do Chipre (onde foram cativados os depósitos) como pano de fundo.
Na época a intervenção do Estado ao Banif já foi olhada de soslaio pelas instâncias europeias. Provavelmente já nessa altura o Banif não tinha salvação a não ser que se investisse muito dinheiro. O tempo não costuma melhorar bancos em dificuldades. Mas uma resolução do Banif naquela altura poderia perturbar a recuperação da percepção de risco em torno de Portugal. No fim de 2012 estava a preparar-se a primeira emissão de dívida de longo prazo em mercado, por parte de João Moreira Rato (presidente, então, do IGCP). Era o regresso aos mercados depois de uma dolorosa ausência provocada pela crise soberana em que o Governo de Sócrates deixara cair o país. Nessa altura os bancos também voltavam ao mercado. Não era fácil deitar o Banif abaixo com uma medida de resolução numa altura tão crucial para a credibilidade financeira. Ajudou-se o Banif, foi feito de forma a fugir ao impacto aos contribuintes. Mas zás pás o problema da credibilidade num banco é quase tão importante como uma má carteira de crédito imobiliário sem colaterais suficientes.
Mas ainda a procissão vai no adro. Falta ainda saber o impacto da provável falência da Rentipar (dona do banco e de parte da Açoreana)
Falta ainda saber qual o impacto nos accionistas e obrigacionista desta medida? Haverá também litigio. É preciso não esquecer que o Banif fez aumentos de capital colocados pelos balcões do Banif, e que agora ficam sem nada.
O António Costa é tão esperto. Reparem garantiu os depósitos TODOS porque já sabia que ia haver uma resolução e uma venda do negócio do Banif a um banco privado antes da nova lei entrar em vigor (a que chama os depósitos acima de 100 mil euros ao resgate). Assim aparece ao público com uma boa notícia (que nunca se iria verificar) que oculta a má (que se ia sempre verificar). Toda a gente olha para o Costa e pensa que pelo menos salvou alguém. Não foi possível salvar os contribuintes... Assim toda a gente está contente com a resolução do Banif apesar dos milhões que isso custa ao erário público (ao contrário do Novo Banco que recai sobre o Fundo de Resolução) e apesar de na pratica os accionistas e obrigacionistas subordinadas terem perdido tudo, tal como no BES.
A propósito do artigo no Blog Corta-Fitas gerou-se uma onda de comentários que conduziu à discussão sobre Direita e Esquerda.
Deixo aqui o meu comentário a um leitor de esquerda que se intitula "comunista", porque julgo que ajuda à discussão:
A Direita defende o mérito e que este seja premiado. O problema de defender "os mais fracos", em vez dos que têm mérito, está no conceito de "mais fracos". É que às tantas está-se a premiar os camaradas em detrimento dos bons, em nome dessa solidariedade de esquerda.
A direita é humana, e maior parte da actividade de assistência social é feita por pessoas de direita (vide Banco Alimentar).
A direita trata as mulheres com uma certa reverência, pela sua feminilidade. Não trata as mulheres como homens, porque elas de facto não o são.
A esquerda é muito igualitária na teoria mas na prática nunca escolhe as mulheres para líderes de nada. Basta ver que a direita tinha uma ministra das finanças. A esquerda tem mulheres em ministérios que não são de grande poder. Vou dar outro exemplo de que tenho experiência. O jornalismo. As redacções são dominadas por pessoas de raiz de esquerda, agora vejam lá quantas mulheres estão à frente dos projectos... Já os banqueiros (esses malandros capitalistas) têm mulheres no seu board.
Para a direita o Estado é para os desfavorecidos e não tem de subsidiar todos por igual.
O Estado tem de deixar de ter funções de empresário, e passar a ser apenas regulador.
A direita defende as instituições e as suas autonomias, o que inclui a independência de poderes (daí que o governo anterior tenha delegado todo o problema da banca no Banco de Portugal e BCE). Defende absolutamente a independência dos diferentes orgãos de soberania.
A direita é contra organizações e coligações informais. Poderes e alianças de poderes paralelos (por exemplo maçonaria).
A direita defende a família e a vida.
P.S. Se o mérito imperasse a defesa dos trabalhadores fazia-se naturalmente. Mas este mundo não é o ideal e por isso a defesa dos trabalhadores (bandeira da esquerda com a qual concordo), torna-se imprescindível num mundo de manhosos que querem despedir para contratar e promover amigos. Mas se os valores fossem outros essa defesa dos trabalhadores não precisava de ser tão cerrada.
Este comentário surge em resposta a outro de um leitor que diz o seguinte:
A CDU é a instituição que mais defende:
- Os direitos dos trabalhadores
- A defesa dos mais fracos
- A promoção da igualdade entre todos, homens e mulheres, nomeadamente
- Os serviços públicos
- Um Estado forte
- Os valores patrióticos
- Os ideais progressistas
- A ecologia
E temos trabalho que fala por nós, desde os nossos deputados aos nossos autarcas. Isto é um facto, não é um ponto de vista.
Depois surge um outro comentário sobre o conceito de mérito que diz o seguinte:
Esta conversa do mérito que direita tanto brande é tão básica que chega a ser um retrato perfeito da sua inteligência. É que o mérito não é um termo que tem um conteúdo concreto que seja facilmente matéria de acordo geral. Méritos há muitos. Como os chapeus. O mérito, por exemplo, já foi o de conseguir criar um mercado de habitação sub-prime e ganhar biliões com um produto sem viabilidade enquanto não estoirou e ter sabido preservar a fortuna depois de ter estoirado.
Sabe-se se lá que mais outros méritos desses andam por aí? Com certeza muitos.
Eu até acho que a máfia siciliana, ou russa, ou chinesa deve ser bastante meritocrática. Se calhar bem mais do que qualquer coisa que você já viu ou conseguiu você mesma...
Vou reproduzir aqui a minha resposta, igualmente por achar que ajuda ao debate do tema:
Mérito é ser o melhor no que faz. O que me está a querer dizer é "como se mede o mérito?". Pois claro que o mérito está ligado a objectivos. Mas se o respeito pelas instituições for uma constante não há lugar para se chamar mérito ao que não é (máfias). As máfias são na verdade o oposto do mérito. As alianças, as irmandades, as internacionais disto e daquilo que o que promovem são os seus, são o oposto do mérito.
Eu conheço bem a história do subprime. Uma sociedade meritocratica como a dos Estados Unidos (nenhuma o é tanto) pode levar ao excesso de querer mostrar resultados a todo o custo. Mas para isso é que existem os reguladores. Porque perseguir o mérito em lucros (e evitar ser demitido em AG por não os ter) pode levar a assumir riscos excessivos. Mas para travar isso estão lá (ou deviam estar) os reguladores.
Adorar a saga Star Wars é um desporto que eu não pratico.
Não gostei do filme, não gosto do maniqueísmo pueril, nem da dimensão novelesca. Não gosto da banalidade das personagens. A única personagem com algum interesse é a sábia de óculos graduados (Maz Kanata) que ensina o caminho para o encontro com Skywalker. Nem Harrison Ford salva isto. Mesmo os efeitos especiais deixam muito a desejar.
Esta senhora, com origens em França, com um ar doce, é uma grande música. Uma pioneira nas sonoridades conceptuais, e portanto só para alguns ouvidos...
Eu poderia vir para aqui, tipo intelectual, fazer o seu apogeu. Porém não não sou hipócrita, e até há dias nunca tinha ouvido falar dela. Seja com for, esta senhora, com ar cândido, tipo avozinha, ultrapassa-me, é um génio, pelo que só me resta tira-lhe o chapéu.
Fiquei bouche bée quando li isto:
António Costa: TAP volta para o Estado, com ou sem acordo
Diz a notícia que o primeiro-ministro António Costa afirmou, em Bruxelas, que o Estado retomará a maioria do capital da transportadora aérea TAP mesmo sem acordo com os compradores privados.
Diz então o senhor que "a execução do programa do Governo não depende da vontade de particulares que resolveram assinar um contrato com o Estado português em situações precárias. Visto que estavam a assinar com um governo que tinha sido demitido na véspera”. O que é falso. O contrato foi assinado muito antes da sessão da Assembleia da República que chumbou o programa do governo. O contrato para a venda da TAP foi assinado a 25 de Junho!
O primeiro-ministro volta a demonstrar que não gosta de ser contrariado. Se a realidade não se adequa à sua vontade, tanto pior para a realidade.
Leis? Contratos? Factos?
"A lei sou eu" (Rei Sol - Luís XIV)
A tirania, ainda que seja sempre um fenómeno a prazo, provoca muitos danos, a História é disso testemunha.
Vamos aos factos:
O que foi assinado a 12 de Novembro foi o acordo com os bancos. O Estado vendeu a TAP a 25 de Junho sujeito a condições suspensivas. A saber: a autorização da Concorrência; o refinanciamento e autorização da autoridade aeronáutica. Dado que todas as condições foram preenchidas, o Estado estava obrigado a cumprir o compromisso de venda de 25 de Junho e assim as acções foram transmitidas para o consórcio e este entrou com o dinheiro na TAP. Ponto final.
António Costa o que pretende fazer? Alterar leis que permitam romper contratos mesmo sem razão? Criar normas que dêem corpo à sua vontade? Mandar nos Tribunais?
Será este país a República das Bananas? Será uma Little Italy?
Ontem as declarações das pessoas que compraram a TAP foram peremptórias. Depois de uma reunião (ao estilo deste PS) do ministro do Planeamento e da Indústria, Pedro Marques, com David Neeleman e Humberto Pedrosa, os sócios da Gateway, que venceu a privatização da TAP, em que não lhes foi apresentada uma proposta formal, avisaram que não abdicam do contrato que têm em mãos.
Em resposta o Senhor Primeiro Ministro bate o pé e diz: A TAP volta para o Estado, com ou sem acordo.
Depois há ainda aquele argumento de que o acordo de venda é mau para o Estado porque os bancos exigiram uma garantia do Estado para reestruturar a dívida da TAP. Primeiro, os bancos não são a Santa Casa da Misericórdia (ainda há quem não perceba isso), e depois a dívida da TAP antes da venda já era responsabilidade do Estado, pois se era este o único accionista. A venda não trouxe uma responsabilidade nova para o Estado.
A venda da TAP permitiu salvar a companhia de um problema de tesouraria.
Diz o líder do consórcio que: “Assinámos o contrato com muitas restrições, há quem fale da situação dos terrenos, estamos a fazer o que temos de fazer para ter dinheiro para que a TAP se salve. Assinámos um acordo que não podíamos tirar um cêntimo de lucro até que a dívida esteja paga. Estamos a investir muito para salvar a empresa”. Mas isso não interessa nada. Salvar a TAP? Não isso não interessa nada. O que interessa é que a TAP seja pública para que os sindicatos da empresa sejam fortes e sejam o braço de força da esquerda. A esquerda se quiser paralisa o país com as greves das empresas de transportes, e é por isso que há anos elas estão no Estado e há anos que são autênticas sanguessugas de dinheiro público.
Mas ora, António Costa teve tanto trabalho a ir para o Governo para parar a venda da TAP que agora não há-de ser um contratozito que o vai travar. Tribunais? Advogados? Contratos? O que é isso? Peanuts.
Acabo de ouvir o António Lobo Xavier a defender o dinheiro dos contribuintes para ajudar a banca. Vamos lá a ver:
O que se passou com o Novo Banco, Banif e CGD?
O Novo Banco está pior do que estava quando houve a Resolução, e agora precisa de mais 400 milhões para se poder capitalizar. Mas na altura a venda do banco por 1,5 mil milhões ou dois mil milhões era uma má venda. Porque os bancos do Fundo de Resolução iam encaixar uma perda face aos 4,9 mil milhões injectados e isso era impensável. Venda-se mais tarde, noutro modelo, dizia-se e vai de chutar para canto. O que vamos ver é que a perda para os bancos vai ser maior e o banco não vai valorizar daqui até Agosto. E veremos se em Agosto se vende.
O Banif dizem que agora é que está mal. Mas o Banif está mal há muitos anos, e foi há dois anos que se descobriu. No caso do Banif o problema do banco é sério e hoje já só se resolve com grandes perdas para o Estado e o tempo não ajudou o banco. Nos últimos dias saíram do Banif 600 milhões de euros em levantamentos.
É preciso ver que os bancos (quer o NB quer o Banif) foram intervencionados ao som de leis europeias e que o BCE tem hoje a supervisão dos maiores bancos europeus.
Mas toda a gente acha que "basta vender". Soluções à la banca de investimento que acreditam que tudo se vende depende da engenharia e modelo financeiro. Mas isso do basta vender, não chega. Porque é mais fácil dizer que "basta vender" sentado num estúdio de televisão, do que vender numa mesa de negociações. Vender pode trazer mais custos do que proveitos. Isso pode não permitir a venda.
Os bancos são vítimas de má gestão e de supervisão apertada do BCE. Andam em bolandas entre resolver problemas de gestão irresponsável encobertos no passado e sobreviver às exigências do supervisor que procura criar almofadas de capital para travar o impacto no sistema das gestões ruinosas. Assim quer o Banif, quer o Novo Banco, quer a CGD (que foi intervencionada, que nunca pagou os CoCos de 900 milhões) quando estão a fugir dos erros passados da gestão levam com as leis do BCE, que exigem mais capital em função do risco da carteira de crédito.
Portugal ainda vive com os fantasmas do "amiguismo" amador que usava a cunha com uma legitimidade natural e de repente isto virou profissional e a cunha passou a tráfico de influências.
Os bancos viviam nesta lógica da facilidade amigável e de repente, zás, a carteira do imobiliário não tem colaterais suficientes e o mercado sofreu um rombo, o país foi intervencionado para evitar a falência, e hoje isso pesa-lhes no capital.
A Caixa, o banco do Estado que toda a gente jurava ser sólido, de um dia para o outro levou com a EBA e teve de receber 900 milhões de euros de CoCo´s do Estado. Depois leva com a Concorrência de Bruxelas a dizer que isto é concorrência desleal e desvirtua a concorrência e a CGD tem de pagar os 900 milhões ao Estado. E agora, para além de não ter gerado capital suficiente para pagar os CoCo´s, leva com o BCE a dizer que com aquela carteira de crédito a CGD tem de ter um common equity tier 1 muito superior ao que tinha e lá passa a CGD de ser a ancora do sistema financeiro para ser um dos mais frágeis.
A culpa é do governo? Não. Mas o Governo é o alvo mais fácil.
Agora a nacionalização torna o fardo mais intrusivo. Resta saber se é mais eficaz. O BPN não foi a melhor experiência.
Se um banco precisa de ser nacionalizado, e sendo Portugal um país onde a rentabilidade não impera (é mais provável haver condições para, depois de nacionalizar o Lloyds, o recuperar), é porque não consegue sobreviver numa lógica de mercado.
Os bancos portugueses, na actividade doméstica, têm rentabilidades mínimas para os capitais que têm. Isto é que ninguém quer assumir. E cada vez mais os bancos portugueses estão a ser empurrados para vender activos e a ficarem resumidos à actividade em Portugal. É uma pescadinha de rabo na boca.
P.S. O Banif poderá ser ajudado pelo BCE, depois de ter perdido depósitos. Vamos ver como corre o desfecho do "caso Banif", que tem o epílogo nos próximos dias. As acções estão suspensas, supostamente por propostas de compra do Santander e Popular.
E não vendeu mais cedo o Banif porque o anterior Governo não quis abrir um concurso para não atrapalhar a venda do Novo Banco. Se houvesse um interessado que se voluntariasse analisariam, mas não abririam um concurso oficial de venda.
Mas não haverá tão bons argumentos para o atrasado na reestruturação do Banif que degradou o valor banco e tornou-o mais barato, isso Jorge Tomé confessa.
Fica por saber porque é que até agora (e ao fim de dois anos) não venderam a carteira de crédito (ligeiramente complicada) de imobiliário, porque não venderam o banco no Brasil e porque não venderam o banco em Malta.
Para já não falar da Açoreana que está há mais de um ano à venda e foi perdendo o interesse. Mas aí percebe-se porquê, é que a venda provocaria uma menos valia que se reflecteria no capital.
Enfim, sad story.
P.S. Jorge Tomé é um banqueiro de louvor, mas o Banif não foi o que lhe correu melhor, há que dizê-lo.
Já estava à espera disto. Rui Rio, com esta indirecta a Passos Coelho, está a afiar a faca e quer ser o senhor que segue na São Caetano.
Se não é isto, então porque raio ele veio ameaçar o ex-primeiro-ministro dizendo que “vai ser difícil Passos ganhar legislativas"?
Revejo-me neste pensamento de Goethe, e de que maneira!