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Quando dos acontecimentos de Paris eu fui na onda, e, como os demais, num quase uníssono, disse que eu também era um Charlie. Disse-o e volto a dizer: “Je suis Charlie”, como poderia ser um Cid, um Vilhena, um Vasco… até mesmo um Bordalo Pinheiro, já que sou, sempre fui, um defensor da liberdade de expressão. Porém, também sou realista, e tal como o Papa Francisco, também acho que "ninguém pode insultar a fé das outras pessoas", sobretudo se o saco ou capacidade de encaixe é terrivelmente pequena!
António Souto explicou à deputada Mariana Mortágua, mas não foi bem entendido. Esta é uma operação complexa e que permitiu três coisas: que o BES financiasse as elevadas necessidades de tesouraria da PDVSA; que os intervenientes investissem em papel comercial do GES; e que os bancos norte-americanos financiassem a petrolífera venezuelana contornando o embargo dos Estados Unidos à Venzuela.
Vejamos:
Mariana Mortágua falou de uma operação especifica de uma construtura chinesa e de uma operação com a Goldman Sachs. Mas essa foi apenas uma delas. Há outras feitas nos mesmos moldes com o Bank of America.
O que se fazia?
A PDVSA precisava de pagar a fornecedores a um prazo longo, mais ou menos ao longo de três anos. O BES assumia o risco PDVSA para pagar aos fornecedores. Emitia cartas de crédito que garantiam o pagamento da PDVSA ao seu fornecedor. O BES assumia o risco PDVSA, mas não tinha liquidez e por isso estabelecia um acordo de contraparte com outro banco que assegurasse a liquidez e esse era a Goldman Sachs ou o Bank of America.
Estas operações foram aprovadas em conselho do banco e dada a elevada exposição foram pedidos colaterais à PDVSA.
O que disse António Souto?
A certa diz que a Goldman Sachs quis tomar parte do risco e desta forma partilhou com o BES essa função. Dividiam as comissões. Mas por causa do embargo dos Estados Unidos à Venezuela, a Goldman Sachs não quis aparecer na operação e negociou com o BES uma operação de financiamento back-to-back. À medida que o BES era obrigado a financiar o fornecedor da PDVSA pedia à Goldman Sachs para desembolsar o dinheiro. Depois à medida que a PDVSA pagasse ao BES, mais ou menos ao fim de um ano e meio, o BES pagava à Goldman Sachs.
O que não disse António Souto?
Que estas operações com a PDVSA eram comuns, isto é, o financiamento a fornecedores da PDVSA. Algumas fizeram-se com o Bank of America em vez de ser com a Goldman Sachs. O circuito era o mesmo. O BES assumia o risco PDVSA ou partilhava-o com o banco contraparte, que disponibilizava a liquidez. Os bancos americanos é que ficavam no fundo a financiar a PDVSA sem o assumirem. Mais. Os fornecedores da PDVSA podiam receber mais cedo se investissem em papel comercial das empresas do GES. A PDVSA podia ter um desconto no pagamento da carta de crédito ao BES se investisse em papel comercial do GES o remanescente.
A proporção de dinheiro que em cada operação ia parar ao GES ia desde os 30% aos 50%. Isso ninguém disse. Mas era sempre aí que tudo ia parar. Muitas operações de financiamento de grande dimensão tinham por contrapartida um investimento na dívida ou capital da ESI, ES Control, Rioforte, etc.
Outra coisa interessante que disse o administrador do BES que tinha o pelouro do crédito a empresas, é sobre o mesmo mecanismo das cartas garantia, mas desta vez aos clientes do BES Angola. Segundo António Souto a confirmação de cartas de crédito e sua liquidação nunca pesaram mais do que 500 milhões de euros num total de exposição de 3,3 mil milhões de euros do BES ao BESA. A desmentir Álvaro Sobrinho portanto.
Havia importadores angolanos que abriam cartas de crédito a favor de exportadores portugueses o BES confirmava as cartas de crédito. Os exportadores exportavam e o BES pagava aos exportadores. O BES debitava de seguida ao BESA esse dinheiro que tinha adiantado e este ia pedir o dinheiro ao importador angolano. Alguns, muitos, não pagaram, mas nunca estes créditos justificaram mais do 500 ou 550 milhões de euros. O BESA é que tinha de ir cobrar aos importadores angolanos. Essa responsabilidade de analisar o risco dos clientes era do BESA.
Ou seja há muito mais do que o crédito a empresas exportadoras a justificar os créditos malparados do BESA.
Mais uma vez é preciso ver que operações estão ligadas ao financiamento do GES.
Sendo que é conhecido que os accionistas do BESA eram também investidores na ESI, na Control, quiça Rioforte e ESFG.
Sobre o argumento de o dinheiro nunca ter saído de Portugal que Álvaro Sobrinho, o rico angolano como se intitulou, usou para explicar que o crédito do BES ao BESA favoreceu o BES. António Souto riu-se do disparate: «O dinheiro estar cá ou lá é irrelevante o que interessa é a que balanço é que pertence».
Os espermatozóides segundo Antony van Leeuwenhoek (1632-1723) não sabiam voar
Depois de ter lido isto, sou obrigado a reconhecer que as crónicas de Osborne, célebre cruzado inglês que ajudou Afonso Henriques na Tomada de Lisboa, afinal não são ficção cientifica, os espermatozóides voam mesmo. Com efeito, o cruzado falava dos nossos ares de forma tão eloquente que dizia serem tão bons, que era o bastante para engravidar as vacas. Ora, e como mais vale tarde do que nunca, aproveito este momento para lhe tirar o chapéu, o medievo inglês sabia do que falava!
O livro é de 2008, e o autor é Pascal Bruckner. Acabo de saber da sua existência e ainda não o li. Mas o título estava nas minhas notas para uma futura análise ao que se passa com a Europa e com os Estados Unidos, neste tempo em que eu vivo. Pensei sempre que há um complexo de culpa neste ocidente, desde o pós-segunda guerra mundial e que explica estes valores em que vivemos. Esta tirânia da compaixão pelas minorias e a tolerância com tudo o que soe a desfavorecido, quer o seja ou não. Olha-se para o Médio Oriente e o que se vê são os judeus ricos e os palestinos pobres, logo não há uma dúvida em que lado se está. A culpa leva a que os Europeus se projectem nas minorias e nos desfavorecidos. Os ocidentais só se sentem bem na identificação com os "fracos e oprimidos".
A paz e o bem estar no mundo ocidental criou um complexo de culpa na Europa tal (com o epicentro em França) que lhe deu para esta caridade por tudo o que mexe, e que vê tudo o que é diferente ora com paternalismo (uma soberba do avesso) ou com desconfiança pelo o que lhe soa superior. É uma forma de expurgar a culpa, parece-me, esta identificação com as causas das minorias. Assim assistimos ao exagero de ver em cada banqueiro um bandido e em cada emigrante (e quanto mais ilegal melhor) um mártir e santo. Em cada pessoa bonita, loira, bem sucedida, e inteligente recai sobre ela uma série de desconfianças. Já as minorias são imediatamente imaculadas. É o resultado de um complexo de culpa histórico.
Sempre achei isso e sempre achei que os Estados Unidos imitaram a Europa nessa mentalidade de ver tudo pelos olhos dos injustiçados. Este Ocidente que só consegue ver injustiça nos pobres e culpa nos ricos, injustiça nos diferentes e culpa nos comuns, é um Ocidente que se apaixona pelos supostos fracos e oprimidos e culpa os bem sucedidos. Há chavões e palavras criadas para condenar quem não alinha com estes valores.
Mas há uma tirania nesta visão deturpada. Por exemplo, se alguém se levanta a pedir para se ser mais rigoroso na recepção de emigrantes, atiram-lhes logo com as acusações violentas de xenofobia. É quase a fogueira dos tempos modernos a intriga e má língua. Mas quando se olha para categorias e não para pessoas há o risco de se ser cego aos detalhes.
Fomos assistindo a uma Europa que quer ser outra coisa, que quer ter outra pele, que recusa o passado.
O Ocidente despreza facilmente o cristianismo em que foi construído para se apaixonar e adoptar imediatamente um budismo. O Tibete faz as delicias deste Ocidente culpado, pois tem todos os ingredientes para fazer os ocidentais sentirem-se identificados e compreendidos.
Voltemos ao livro. O autor deste livro, tem outro que se chama A Tirania da Inocência, o que também é um título interessante.
Sobre «O complexo de culpa do Ocidente». O que diz o resumo do livro de Pascal Bruckner? «Todo o mundo nos odeia e eles têm toda a razão: é esta a convicção da maioria dos europeus e, a fortiori, dos franceses. Desde 1945 que o nosso continente vive dominado pelo tormento e pelo arrependimento. Martirizando-se com as atrocidades do passado, as guerras constantes, as perseguições religiosas, a escravatura, o fascismo, o comunismo, a sua História não foi senão uma longa cadeia de carnificinas, o que culminou nas duas Guerras Mundiais, ou seja, num suicídio fanático. Face a este sentimento de culpa, uma elite de intelectuais e políticos entrega os seus títulos e vota-se à manutenção da chama dessa culpa, à semelhança do que fizeram os guardiães do fogo: deste modo, o 'Ocidente' passou a estar em dívida para com tudo o que ele não representa, a ser suspeito em todos os acontecimentos, condenado a reparar todos os males. À medida que se vão remoendo, os países europeus esquecem-se que eles, e só eles, fizeram esforços para vencerem, reflectirem e se isentarem desta barbárie. E se o acto de contrição não fosse senão a outra face da abdicação?»
Voilá. Alguém já escreveu esse livro que eu um dia imaginei ao de leve.
Imagem actualizada, encontrada aqui.
A reboque dos atentados ocorridos em Paris, em que se inclui o ataque ao supermercado Cacher na Porte de Vincennes, e olhando para a mole humana que marcha contra o medo na capital francesa – que agrega pessoas dos mais variados pólos ideológicos – , cheguei a uma conclusão. A que se deve mobilização? Se a explicação não é ideológica, então o que os leva a marchar?
Se o ataque aos pilares do ocidentalismo é, por si só, um bom motivo. Creio bem que existe uma outra variável que não pode ser ignorada. Com efeito, há uma componente temporal que não pode ser escamoteada: Hoje, no Ocidente (e por maioria de razão nas grandes metrópoles europeias) perdemos a dimensão do amanhã, de futuro, e isto é que é (para mim) verdadeiramente preocupante! Efectivamente, ficamos invariavelmente reféns do nosso devir. E a noção de futuro que sempre foi a mole do nosso próprio desenvolvimento (cientifico, político, social, etc.) perdeu-se, ou está doravante condicionado por estas gentes!
Como dois estranhos
Cada um na sua estrada
Nos deparamos, numa esquina
Num lugar comum
E aí? Quais são seus planos?
Eu até que tenho vários
Se me acompanhar
No caminho eu posso te contar
E mesmo assim, eu queria te perguntar
Se você tem ai contigo alguma coisa pra me dar
Se tem espaço de sobra no seu coração
Quer levar minha bagagem ou não?
E pelo visto, vou te inserir na minha paisagem
E você vai me ensinar as suas verdades
E se pensar, a gente já queria tudo isso desde o inicio
De dia, vou me mostrar de longe
De noite, você verá de perto
O certo e o incerto, a gente vai saber
E mesmo assim, queria te contar
Que eu talvez tenho aqui comigo
Eu tenho alguma coisa pra te dar
Tem espaço de sobra no meu coração
Eu vou levar sua bagagem e o que mais estiver à mão
E mesmo assim, queria te contar
Que eu tenho aqui comigo alguma coisa pra te dar
Tem espaço de sobra no meu coração
Eu vou levar sua bagagem e o que mais estiver à mão
Servirá de consolo saber que as autoridades (leia-se forças de segurança) francesas mataram os dois suspeitos do ataque ao "Charlie Hebdo" e o autor do sequestro em Paris? Não sei não, para mim a profissão ainda está no adro!