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Todos os herdeiros das actuais monarquias reinantes europeias estão casados com plebeias ou plebeus, sem sangue real nem aristocrata, descendentes de taxistas, mineiros, piratas etc. E ainda bem, se os nobres continuassem sempre a casar entre si acabariam feios, gordos, estúpidos e com graves problemas de saúde, como era o caso antigamente (salvo raras excepções). O sangue deve ser renovado e Alberto do Mónaco também não quis fugir à regra. Já a noiva é que parece ter querido fugir-lhe a dias do casamento, segundo o L'Express, pelo menos.
Quem acompanhou a emissão televisiva há-de ter estranhado a falta do habitual carinho e sorrizinhos entre os noivos, as mãos dadas com demasiada força etc. Nada disso, Alberto mal olhou para a noiva, nunca sorriu e quando ela chorou não se mostrou afectado. As famosas irmãs idem, nem um sorriso para as câmaras, excepto quando posaram para as revistas. E por isto só quem viu a emissão televisiva (e está em casa desempregado) pôde aperceber-se desta frieza, o que as revistas mostram não é real (e também tenho visto muitas já que a minha mãe está no hospital).
Alberto do Mónaco precisa urgentemente de um filho, caso contrário o principado volta para o domínio francês, (segundo dizem na Visão). Para esse fim escolheu uma ariana de excelente forma física, mas de cabeça muito instável pois a rapariga não pensou duas vezes antes de pôr em perigo o nome, os negócios, a diplomacia e a própria existência do pequeno principado. Isto promete a boa trapalhada amorosa a que o Mónaco já nos habituou.
Fui ao cinema. Cheguei atrasada mas a tempo de apanhar o statement sobre o qual se constrói todo o filme: «Há a via da graça e a via da natureza». A partir daí foquei a minha atenção académica e emocional no modo como o relizador iria apresentar-me o que interpretei como as duas dimensões com que completamos o ser humano: a física e a metafísica. Malick misturou-as e fundiu-as, tanto na história (no pai e na mãe), como nas imagens da vida na Terra que nos chegavam com grandiosidade estética e melódica. A pessoa ao meu lado queixou-se de ter pago para ver o National Geographic mas não me deixei distrair por esse comentário óbvio porque estava a tentar apanhar a perspectiva e não o objecto em si e a gozar a capacidade única do cinema para construir tempo e espaço à velocidade da luz, ou à velocidade do pensamento (sou daqueles que ainda agradece aos Santos Lumière pela graça do cinema, bom e mau).
Entretanto informei-me e vim a saber que este filme é considerado pretensioso. De facto, a mensagem que veicula é extremamente simples e os suportes que a sustentam são extremamente rebuscados, o que, segundo Umberto Eco, é a definição de mau gosto. Todavia, assim sendo, a capela sistina é extremamente pretensiosa, a nona sinfonia é pretensiosa, os poemas de amor são pretensiosos, a maior parte das tragédias gregas (que tratam o mesmo problema exposto em Árvore da Vida) são pretensiosas etc. etc. - eu própria sou pretensiosa. Um dos problemas é que fazer um poema visual sobre a condição humana arrisca sempre alguma pretensão, algum tropismo, que, como sabem, se alimenta dos lugares-comuns da retórica, quer queiramos quer não. Outro problema é que o filme é belo, esteticamente aprazível, e suponho que os fãs de Malick, exijam arte e não design, isto é, exijam algo chocante e não algo «decorativo»; mas este é um problema que afecta toda a arte actual que vive em litígio com a beleza, os artistas fogem hoje do cânone do belo como como o diabo da cruz, com medo de não parecerem artistas, felizmente o realizador borrifou nesta fobia. Pessoalmente gostei muito. A princípio pensei estar apenas perante um remake do 2001 Odisseia no Espaço, mas no fim saí do cinema com a sensação de que 2001 foi um mau remake deste filme. Gostei da angustia entre repressão e expansão, gostei da cisão entre entrega e conquista. Gostei, é claro, porque sou pretensiosa, do grande paradoxo humano representado nos filhos, ou seja, na possibilidade de fim e de continuidade. Eu explico. Os filhos são passaporte da nossa felicidade (a felicidade é o futuro, a vida eterna, a dimensão para além de nós) mas são também o passaporte da mais atroz infelicidade: se os perdemos, se morrem, morre com eles não apenas a nossa pessoa mas a promessa da nossa pessoa, morre a nossa salvação, morre o eu e morre o eu depois de mim. No entanto esta tragédia só existe no pensamento físico e linear. No pensamento metafísco não há tragédia porque a linha da vida se apresenta ciclicamente e não linearmente, a esfera não tem fim nem princípio, qualquer ponto é o centro e a angústia desaparece ao aceitarmos que a árvore da vida é naturalmente a árvore da morte. Catitérrimo.
Ando a ver esta nova série da Fox, «Espartacus». Não é especialmente boa, nem especialmente má e é suficientemente fiel à documentação histórica sobre essa outra profissão mais antiga do mundo: o gladiador (que tanto origina em guerreiros mercenários como desemboca em jogadores de futebol).
A violência é estética qb (o sangue é jorrado num efeito propositadamente fictício) de modo a que não seja necessário que o telespectador feche os olhos durante os combates, e se o sexo é bastante realista será porque já ninguém se importa com a explicitude. De qualquer forma aconselha-se viewer discretion. Confesso que o que me levou a ver o primeiro episódio foi a perfeição simétrica da cara do actor que anda por aí nos placards de rua, com muito mais appeal que o gladiador original Kirk Douglas, no entanto, depois de filmado, vê-se que não tem a mesma potência esteroide de Douglas.
A receita de Hollywood para nos identificarmos com prostitutas ou gladiadores é sempre a mesma: são obrigados a aderir à velha profissão para alimentar os filhos ou salvar amados, de qualquer modo uma boa dose de violência estaminal faz-me sempre bem para sair da apatia de domingo à noite e enfrentar a arena da semana de trabalho. Por outro lado continua a ser simpático ver homens desviarem-se com destreza de uma matraca de ferro com picos só pelo amor de uma mulher, sobretudo porque hoje dificilmente nos emprestam um chapéu-de-chuva. E depois há todas as outras personagens e situações cujo protótipo ainda vigora, os que têm sede de poder, os manipuladores, os que promovem uma gestão danosa para viver na aparência de riqueza, etc.